segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

NO REINO DAS BORBOLETAS

     Esta bela fábula é mais uma contribuição da minha amiga Poliana Martins aos leitores deste blog. Faz parte do livro “Contos e Apólogos” (cap. 29), escrito pelo Espírito Irmão X (Humberto de Campos), pela psicografia de Chico Xavier. Veja, também, mais duas ótimas contribuições da Poliana aos leitores deste blog: "Uma Parábola sobre o Céu e o Inferno" e "Pensando Por Si Mesmo!".

     À beira de um charco, formosa borboleta, fulgurando ao crepúsculo, pousou sobre um ninho de larvas e falou para as pequeninas lagartas, atônitas:
     - Não temais! Sou eu... Uma vossa irmã de raça!... Venho para comunicar-vos esperança. Nem sempre permanecereis coladas à erva do pântano! Tende calma, fortaleza, paciência!... Esforçai-vos por sucumbir aos golpes da ventania que, de quando em quando, varre a paisagem. Esperai! Depois do sono que vos aguarda, acordareis com asas de puro arminho, refletindo o esplender solar... Então, não mais vos arrastareis, presas ao solo úmido e triste. Adquirireis preciosa visão da vida! Subireis muito alto e vosso alimento será o néctar das flores... Viajareis deslumbradas, contemplando o mundo, sob novo prisma!... Observareis o sapo que nos persegue, castigado pela serpente que o destrói, e vereis a serpente que fascina o sapo, fustigada pelas armas do homem!...
     Enquanto a mensageira se entregava à ligeira pausa de repouso, ouviam-se exclamações admirativas:
     - Ah! Não posso crer no que vejo!
     - Que misteriosa e bela criatura!...
     - Será uma fada milagrosa?
     - Nada possui de comum conosco...
     Irradiando o suave aroma do jardim em que se demorava, a linda visitante sorriu e continuou:
     - Não vos confieis à incredulidade! Não sou uma fada celeste! Minhas asas são parte integrante da nova forma que a Natureza nos reserva. Ontem vivia convosco; amanhã, vivereis comigo! Equilibrar-vos-eis no imenso espaço, desferindo vôos sublimes à plena luz! Libertadas do chavascal, elevar-vos-eis, felizes! Conhecereis a beleza das copas floridas e o saboroso licor das pétalas perfumadas, a delícia da altura e a largueza do firmamento!...
     Logo após, lançando carinhoso olhar à família alvoroçada, distendeu o corpo colorido e, voltando, graciosa, desapareceu.
     Nisso chega ao ninho a lagarta mais velha do grupo, que andava ausente, e, ouvindo as entusiásticas referências das companheiras mais jovens, ordenou, irritada:
     - Calem-se e escutem! Tudo isso é insensatez... Mentiras, divagações... Fujamos aos sonhos e aos desvarios. Nunca teremos asas. Ninguém deve filosofar... Somos lagartas, nada mais que lagartas. Sejamos práticas, no imediatismo da própria vida. Esqueçam-se de pretensos seres alados que não existem. Desçam do delírio da imaginação para as realidades do ventre! Abandonaremos este lugar, amanhã. Encontrei a horta que procurávamos... Será nossa propriedade. Nossa fortuna está no pé de couve que passaremos a habitar. Devorar-lhe-emos todas as folhas... Precisamos simplesmente comer, porque, depois, será o sono, a morte e o nada... Nada mais...
     Calaram-se as larvas, desencantadas.
     Caiu a noite e, em meio à sombra, a lagarta-chefe adormeceu, sem despertar no outro dia. Estava ela completamente imóvel.
     As irmãs, preocupadas, observavam curiosas o fenômeno e puseram-se na expectativa. Findo algum tempo, com infinito assombro, repararam que a orgulhosa e descrente orientadora se metamorfoseara numa veludosa falena, voejante e leve...
     Anotando a lição breve e simples, creio que há muitos pontos de contacto entre o reino dos homens e o reino das borboletas.


     O que impede uma larva de se transformar em borboleta? A morte ou a doença. E as pessoas, o que as impede atingir um nível superior de consciência e espiritualidade? 
     As doenças da alma não exatamente as impede, mas as atrasa, às vezes por milênios, através das várias encarnações. Tais doenças podem ser resumidas nos chamados 7 vícios capitais pela tradição cristã. São hábitos negativos de se recair freqüentemente na: vaidade/orgulho (soberba), inveja, ira (raiva, ódio), preguiça, avareza, gula, luxúria.
     O que os faz capitais? Para Tomás de Aquino (questionável sob alguns aspectos, mas com importantes contribuições e insights), os mais importantes desses 7 vícios são dois: (1) a hybris, ou soberba, um orgulho desmesurado (embora, tenho visto na clínica, podendo até ser camuflado por uma pretensa humildade); e (2) a acídia, uma autodesvaloriação desequilibrada, na qual a pessoa desacredita de tudo, a começar de si mesma.
     A vacina e o remédio contra esses vícios são conhecidos também pela tradição cristã. Paulo de Tarso sintetiza sublimamente este remédio/vacina num trecho de sua 1a. carta aos coríntios (I Cor 13: 1-13), na qual as frases finais ensinam-nos que: "Por hora, subsistem a fé, a esperança e a caridade - as três. Porém a maior delas é a caridade". 
     Lembrando que caridade é a tradução latina do grego ágape (amor fraternal, altruísta), Paulo de Tarso reforça o remédio prescrito por Jesus - "amarás teu próximo como a ti mesmo", em harmonia com o amor a Deus (Mat 22: 34-40, Mar 12: 28-34 e Luc 10: 25-28) - para as doenças da alma.

Um comentário:

  1. Amei a postagem,

    Parabéns pelo blog.

    Beijos,

    Virna Soledade
    www.superandocancerdemama-virna.blogspot.com

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