Muitos dos nossos problemas decorrem de percebermos apenas um dos lados das situações e das pessoas. Quando sentimos simpatia por alguém, nossa tendência é perceber apenas suas qualidades. Ocorre o oposto em relação à nossa percepção das pessoas com quem antipatizamos. Somos, geralmente, unilaterais. O nosso progresso em direção a um melhor relacionamento com os outros e uma maior paz de espírito passa pelo nosso esforço em desenvolver uma visão mais equilibrada das pessoas e situações.
Uma estória, que me foi contada há muitos anos por uma mestra espiritual, conhecida carinhosamente por seus discípulos como Tia Zaíra, nos ensina algo neste sentido.
Há muito tempo atrás, os discípulos de um mestre estavam se acusando mutuamente: “Fulano não fala a verdade!”, “Sicrano é orgulhoso!”, “Beltrano come demais!” e assim por diante... O mestre nada disse. Apenas pegou uma grande tela branca, um pincel e, molhando-o em tinta preta, fez com ele um pontinho preto no meio da tela.
Em seguida, chamou um dos seus discípulos e perguntou-lhe:
̶ O que você vê nesta tela?
Sem hesitar, o discípulo respondeu:
̶ Um pontinho preto!
Chamou a outro discípulo e repetiu a pergunta:
̶ O que você vê nesta tela?
O segundo discípulo olhou com cuidado, examinou toda a tela e disse:
̶ Um pontinho preto.
O mestre foi chamando cada um dos demais discípulos. Alguns davam a resposta imediatamente, outros examinavam com cuidado a tela, e outros, ainda, chegavam até a apertar os olhos para ver se havia mais alguma coisa na tela. Contudo, ao final, todos davam a mesma resposta: “Um pontinho preto.”
O mestre, então, olhou para cada um dos discípulos e, mostrando a tela, disse:
̶ Com toda esta grande extensão branca da tela, vocês só enxergam este pontinho preto?
Os discípulos se entreolharam com surpresa. E o mestre prosseguiu:
̶ Da mesma forma, vocês só estão enxergando o pontinho preto uns dos outros, sem considerarem toda a extensa área clara de qualidades e boas realizações que têm!
Quantas vezes deixamos de ver o lado positivo das pessoas? O termo “falar dos outros” é usado como sinônimo de falar mal, tal a freqüência que, ao falar de alguém, tendemos a enfatizar seus defeitos reais ou imaginários e fatos negativos em que está envolvido, em detrimento de suas qualidades e sucessos. Esta visão negativa pode nos contaminar, também, viciando-nos a ver principalmente os aspectos negativos das pessoas e situações, o que pode nos tornar, por vezes, parte dos eventuais problemas com que nos defrontamos, ao invés de contribuirmos para a solução.
Por esta razão, quando começarmos a pensar ou a falar nos defeitos ou insucessos de alguém, busquemos passar pelas três peneiras que esta estória (que se teria passado com Sócrates) nos ensina:
... Certa feita, um homem esbaforido aproximou-se do filósofo e disse-lhe:
̶ Escute, Sócrates... Na condição de seu amigo, tenho alguma coisa muito grave para dizer-lhe a respeito de um conhecido nosso.
̶ Espere!... – disse o sábio, com prudência. – Já passou o que me vai dizer pelas três peneiras?
̶ Três peneiras? – perguntou o visitante, espantado.
̶ Sim, meu amigo, três peneiras. Observemos se sua confidência passou por elas. A primeira é a peneira da verdade. Você tem absoluta certeza, quanto àquilo que pretende comunicar?
̶ Bem, - ponderou o interlocutor, - assegurar mesmo, não posso... mas ouvi dizer e... então...
̶ Portanto não passou pela primeira peneira. Decerto então passou o assunto pela segunda peneira, a da bondade. Ainda que talvez não seja real o que julga saber, será pelo menos bom o que quer me comunicar?
Hesitando, o homem replicou:
̶ Isso não... Muito pelo contrário...
̶ Ah! – tornou o sábio – então recorramos à terceira peneira, a da utilidade, e notemos o proveito do que tanto o aflige.
̶ Útil?!... Disse o visitante muito agitado. – Útil, útil não é...
̶ Bem – rematou o filósofo num sorriso, – se o que você tem a confiar não é verdadeiro, nem bom e nem útil, esqueçamos o problema e não se preocupe com ele, já que nada constrói de positivo para nós!...
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